“Não ficou nada por fazer”
Em grande plano no São João de Ver, equipa do Campeonato nacional de Seniores, Cândido Costa não tem planos de regressar aos palcos profissionais. A menos que seja para comandar uma equipa técnica.
Agarrou na bola por brincadeira, assim como quem não quer a coisa. Jogava com amigos na rua e foi o pai quem lhe achou o jeito. Cândido Costa dava assim os primeiros passos de redondinha colada ao pé, na Sanjoanense. Depois disso, acabou por ingressar na formação do Benfica para fazer três anos de juvenil. “Foram momentos muito bons”, recorda, “tenho as melhores memórias do Benfica e fui muito bem tratado. Fiz uma formação que acabou por ser muito importante para a carreira que fiz”. Nos entretantos, ganhou títulos e ainda foi convocado para a Seleção Nacional. “Tenho orgulho”, remata. Mas o pontapé de saída para uma carreira recheada tinha acabado de ser dado.
Cândido Costa abraçou os anos de futebolista sénior no Salgueiros, mas a meia época no Vidal Pinheiro acabou por ser interrompido ao rumar ao FC Porto, clube de sonho do extremo português. “Nunca o escondi: o FC Porto sempre foi o clube do meu coração”, confessa. “Tinha essa aspiração. Quando saí do Benfica, acreditava que não ia ficar muito tempo no Salgueiros, que haveria hipóteses de ir para o FC Porto, por isso foi o concretizar de um sonho. Também estava habituado a estar num clube grande. Quando cheguei ao FC Porto encontrei muitas semelhanças e senti-me muito feliz porque foi uma aposta ganha”, revela. Esses anos foram “maravilhosos”. Cândido jogou quase sempre até à chegada de Octávio Machado nessa altura “a chama apagou-se um pouco” e o jogador não conseguiu adaptar-se aos métodos do técnico. “Depois chegou o Mourinho e tornei a reavivar a minha imagem. Ganhei títulos, foram três anos em que tive de provar aos outros e a mim mesmo o meu valor”, observa. Ainda assim, a ambição levou-o a um lugar menos desejado. “Tenho um sentimento de que poderia ir mais longe”, confessa, “saí do FC Porto por decisão minha, não fui empurrado, mas foi uma decisão muito burra da minha parte. Tinha perdido o lugar na Seleção de sub-21 e saí para jogar mais. Hoje reconheço que foi o maior erro da minha vida”, lamenta.
Depois do tempo no FC Porto, Cândido jogou meia época no Vitória de Setúbal, onde esteve por empréstimo. A experiência “correu bem em termos de balneário e para me dar uma melhor imagem daquilo que são os clubes”. “É uma realidade à qual eu não estava habituado”, relata, “quando cheguei ao Setúbal, falava-se mais dos ordenados em atraso do que propriamente no adversário. Foi muito complicado a esse nível, os jogadores estavam algo desanimados. Eu não estava habituado a ir para os jogos e lutar por um empate. Nesse aspeto foi chocante para mim, mas preparou-me para a realidade do futebol”. A época seguinte fez-se no Derby County, e aí a vida foi bem mais animadora. O regresso só se dá na perspetiva de voltar ao FC Porto, que acabou por não se concretizar. Mas, em Inglaterra, Cândido Costa participou em todas as partidas e acabou por ser muito importante para o clube.
Já não havia Mourinho no FC Porto e Luigi Del Neri não incluiu o médio portista no plantel. Com Jesualdo Ferreira no Braga, Cândido assinou para fazer parte do projeto e “foi um relançar de carreira”. Jogou com regularidade mas acabou por sair do clube arsenalista, sendo que o destino seguinte se tratou do Belenenses. Quatro longos anos nos azuis do Restelo deram-lhe um lugar na história da instituição lisboeta. Ainda assim, o último ano é o mais triste, quando a equipa de Belém desce à II Liga. “Nessa altura, eu tinha contrato com o Belenenses de mais uma época, com valores que não iriam ser suportáveis. Por isso, tive uma atitude de homem, sentei-me com o presidente, e, apesar de ser querido pela massa associativa e de ser capitão de equipa, abdiquei daquele ano de contrato e rumei a outro país. Não me arrependo, apesar de ter ido ganhar muito menos na Roménia, mas ganhei também o respeito e o carinho dos adeptos do Belenenses. Quando voltei para jogar pelo Tondela frente ao Belenenses, há dois anos, aconteceu uma homenagem que foi o momento mais bonito que senti. Valeu a pena”, conclui.
Nos anos seguintes, o Arouca e o Tondela foram as casas de Cândido Costa. No caso do Arouca, a estadia fica marcada pela grave lesão que o afetou, uma rotura dos ligamentos cruzados. “Esta foi a grande razão para eu estar a jogar onde estou agora.” Depois de um ano parado, o médio acaba por rumar ao Tondela, que acreditou que “o Cândido podia voltar a ser o Cândido”. No entanto, o Cândido acabou por não jogar tanto quanto gostaria e saiu para o São João de Ver. “Este é um clube muito meu”, observa, “fez um bom campeonato esta época no CNS, com muito mérito. Não é um clube rico, vai cumprindo com as suas obrigações, mas a verdade é que há clubes muito mais dotados financeiramente nesta luta”. E há diferenças entre os campeonatos profissionais e o CNS? “Sem dúvida. Logo a começar pelo rigor dos treinos, e nem tem a ver com a falta de condições. Passa desde logo pela disposição dos jogadores, muitos deles trabalham e vêm para o treino ao final do dia. O treinador também sente que não pode cobrar a um jogador que esteve a trabalhar o dia todo e vem treinar às 18h30 o mesmo que exigiria a um profissional. É uma luta muito grande, são clubes que vivem de fundos que vêm da Federação e da Liga e quando essas falham fica uma casa a arder.”
É uma carreira sem arrependimentos para Cândido Costa. “Há sempre coisas que a gente faria de outra maneira e eu não sou exceção”, concorda. “Por vezes sou invadido pelo pensamento de que poderia ter ido mais longe”, pondera, “mas também tenho consciência de que poderia ter ficado aquém do que fiz e que poderia não ter conquistado o oque conquistei. Foi o que foi e gosto do meu percurso no futebol”. Em suma, “não ficou nada por fazer, há um percurso grande que define o porquê de estar onde estou”. Por agora, “vou jogar onde me sentir bem, ainda sinto que sou útil e que imponho respeito. Quando sentir que não sou capaz de defender o que fui no passado, sou o primeiro a sair de uma forma digna”. E sair para onde? “Pelo feitio que tenho, pela análise que faço à pessoa que sou e pelo sumo que bebi ao longo da minha carreira, penso que daria um treinador interessante. Vou começar a tirar o curso na primeira oportunidade que tenha.” Ficamos à espera desse dia.
Cândido Costa não termina a conversa sem agradecer ao Sindicato. “A relação convosco sempre foi ótima, sou amigo do SJPF e pedi aconselhamento sempre que necessário. Tenho orgulho em ser sócio e aconselho todos os jogadores a sê-lo. É uma ferramenta nossa, é alguém que está sempre do nosso lado, não de uma forma cega mas de uma forma justa. Acho que é dos poucos órgãos que nos defende”, garante.
Cândido Alves Moreira da Costa
Data de Nascimento: 30/04/1981
Posição: Médio
Clubes: Salgueiros, FC Porto, V. Setúbal, Derby County, Braga, Belenenses, Rapid Bucareste, Arouca, Tondela e São João de Ver