“Sonho jogar na Selecção”


Jogadora enaltece o trabalho do SJPF.

A jovem jogadora de 18 anos, que actua na Associação Desportiva e Cultural da Encarnação e Olivais (ADCEO) do segundo escalão do futebol feminino, revela como ingressou na modalidade, fala das metas para o futuro e avalia o trabalho desenvolvido pelo Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol (SJPF).

Carla Couto (CC): Quem é a Laura Costa?

Laura Costa (LC): Tenho 18 anos, entrei este ano para a Universidade, estou a estudar Medicina Veterinária, que era a minha primeira opção, vivo com a minha mãe e com dois dos meus irmãos, sendo que a minha irmã mais velha vive fora de casa. Sou a mais nova e na minha família sou a única que gosta de futebol.

CC: Como é que surgiu esse gosto pelo futebol?

LC: Foi na escola. Nós tínhamos campos de futebol e comecei a jogar com os rapazes e também havia mais raparigas que jogavam e foi desde os cinco, seis anos de idade que me interessei pela modalidade.

CC: Qual foi o teu percurso até hoje? Onde é que jogaste?

LC: Aos meus 12, 13 anos joguei futsal com rapazes, no ano seguinte pratiquei futsal nos Onze Unidos no meu primeiro ano sénior, depois fui para o Bobadelense, joguei um ano como federada e no ano seguinte só treinava, sem estar federada, por causa da escola. Aos 17 anos vim para o ADCEO onde estive na equipa de juniores e este ano comecei a jogar pelas equipas de juniores e seniores.

CC: Tens apoio da tua família para jogares futebol?

LC: Eu nunca tive apoio da minha família porque ninguém teve este gosto pelo futebol, nem o meu irmão. Queriam sempre que estivesse mais concentrada nos estudos, por pensarem ser o mais importante, diziam que o desporto tinha de ficar para trás e que o futebol era só para rapazes. Diziam-me sempre que o futebol não era para mim.

CC: Como é que tu, tendo essa contrariedade, consegues manter-te fiel e continuares a jogar e a treinar? Como é que concilias os estudos com o futebol?

LC: A minha família não me pôde proibir de jogar futebol porque tive sempre uma boa avaliação na escola. Sabia que a minha mãe me tiraria do futebol se eu tivesse más notas, por isso tentei sempre manter os bons resultados na escola. Como tinha uma boa avaliação, não me podiam proibir de treinar e jogar. Com a entrada para a universidade torna-se um pouco mais complicado, devido ao horário dos treinos, mas por enquanto estou a conseguir conciliar os estudos com o futebol. Quem corre por gosto não cansa.

CC: Porque é que decidiste estudar Medicina Veterinária?

LC: Desde pequenina que gostei muito de animais e mesmo quando foi para escolher a área, sabia que iria ser algo relacionado com animais ou desporto. O gosto por animais esteve sempre presente e estudar Medicina Veterinária era um dos meus objectivos.

CC: E os teus amigos apoiam-te por jogares futebol, costumam ver-te?

LC: Se não tivesse apoio de ninguém era complicado. Na escola, a partir do 10.º ano, era a que mais falava de futebol. Às segundas-feiras falava com os meus colegas rapazes sobre isso e às vezes eles assistem aos meus jogos na bancada e eu também vou ver jogos deles. Também tenho amigas que fazem dança e ballet e elas acham imensa piada porque damo-nos muito bem e são desportos completamente diferentes. Há uma boa relação.

CC: Nesta carreira tão curta no futebol de onze quais são os teus principais objectivos? Que metas queres alcançar enquanto jogadora?

LC: Como qualquer jogadora tenho o sonho de jogar na Selecção desde pequenina, mas sem o apoio da minha família coloquei sempre essa ideia um pouco de lado porque os meus pais diziam que não se conseguia viver só com o futebol e que tinha de enveredar por outro caminho. Mas no ano passado o meu treinador reavivou-me essa vontade de chegar à Selecção Nacional e essa será uma das metas. Vou lutar por isso, mesmo que seja difícil.

CC: Quais são as maiores dificuldades que encontras na modalidade?

LC: Eu encontro em termos de clubes, porque há muitos que não aceitam muito bem o futebol feminino. É como se dessem prioridade aos masculinos em termos de horários de treino e em termos de organização. O futebol masculino tem sempre prioridade. Ainda há muito preconceito das pessoas da direcção em relação ao futebol feminino. Confesso que quando entrei, tive alguma dificuldade em encontrar um clube relativamente perto de casa para jogar. Era o Bobadelense que ficava mais perto. Depois quando surgiu a oportunidade vim para o ADCEO, porque sou dos Olivais.

CC: Na tua perspectiva o que achas que falta no futebol feminino para que a modalidade possa crescer ainda mais em Portugal?

LC: Talvez os clubes investirem um pouco mais, tentarem cativar mais as jogadoras, porque em termos de raparigas ainda há muito o preconceito de jogar futebol. É como se fosse algo à parte, é como se fosse um rapaz que faz ballet.

CC: O que gostarias de ver verdadeiramente no futebol feminino em Portugal?

LC: Equipas de renome, como por exemplo o Sporting, o Benfica e o FC Porto, que já podiam ter investido no futebol feminino há imenso tempo e podiam dar nome ao futebol feminino, mas ainda não o fizeram. O Sporting já avançou com o futsal feminino no ano passado, mas penso que isso seria muito bom para o futebol de onze porque está tudo um pouco atrasado. As pessoas iriam começar a apoiar mais, tendo em conta que são clubes com nome e história e por isso ajudariam a crescer o futebol feminino.

CC: Como vês o trabalho que o Sindicato tem feito em prol do futebol feminino e da jogadora portuguesa?

LC: Na minha opinião tem sido um excelente trabalho porque tem promovido o futebol feminino no país com prémios individuais, através dos media, transmitindo um ar mais profissional. Em Portugal, o futebol feminino é amador e as pessoas mais velhas ficam a conhecer um pouco melhor a modalidade pela imprensa. Penso que o maior problema é as pessoas mais velhas, que rejeitam um pouco a ideia de as raparigas jogarem futebol e nesse sentido o SJPF ajuda as pessoas a manterem-se informadas.

CC: Que conselhos darias a uma jogadora que queira começar a jogar mas que ainda tenha aquele medo por causa do que os outros possam dizer?

LC: Primeiro que tudo, cada um tem de seguir o que gosta e depois lutar por isso. Se uma pessoa gosta mesmo de jogar futebol e é isso que quer fazer, não deve ter medo, independentemente da opinião da família e dos amigos. Se gostam mesmo daquilo, os outros vão ter que acabar por aceitar e apoiar essa pessoa. Com a visibilidade que o futebol feminino está a ter ao longo do tempo, isso vai acabar por passar e vão ter muito mais facilidade em encontrar colocação porque estão a abrir muitos clubes de futebol feminino. Por exemplo, quando eu tinha 14 anos, tive logo de jogar com as seniores, que tinham 20, 30 anos, e penso que hoje em dia está muito mais facilitada essa integração das jogadoras mais jovens no futebol feminino.