“Custa estar longe da família”
A quinta experiência no estrangeiro.
Ajudou o Tondela a ganhar o título da Segunda Liga e decidiu voltar a emigrar para viver a sua quinta experiência no estrangeiro.
Tozé Marreco está a adaptar-se bem à Bélgica, mas admite que é difícil lidar com a distância da família.
Assinou pelo Mouscron a 28 de Agosto, perto do fecho do mercado. Estava ansioso?
Estaria preocupado se não tivessem existido propostas, mas houve sempre. Assim que acabou a época o Mouscron foi dos primeiros clubes que me sondou, mas houve uma série de situações que me levaram a adiar e fiquei tranquilamente à espera da proposta certa.
Como está a ser a adaptação à cidade?
Falar francês e inglês ajuda-me muito, mas já estou habituado ao processo de chegar, escolher casa, esperar pelo carro e resolver essas coisas. É uma parte essencial: teres o teu espaço, forma de deslocar e televisão portuguesa. E fiz isto tudo em tempo recorde. Na Bélgica as casas estão sem mobília, nada, e em três semanas resolvi tudo.
E ao clube?
Está a correr bem. Tentam fazer actividades para ajudar ao espírito de equipa. Hoje fomos andar de karts, foi muito giro. Temos algumas nacionalidades diferentes, apesar de aqui haver um mínimo obrigatório de jogadores belgas que têm de estar na lista dos 18 convocados.
Faltam medidas como essa ao futebol português?
Sempre disse que pelo menos nas camadas jovens devíamos ter um número exorbitante de portugueses. Olhamos para a formação e vemos jogadores de todo o lado. Esta geração belga cheia de estrelas como Courtois, Hazard e Lukaku não apareceu por acaso. Houve um trabalho que agora dá os seus frutos.
Que diferenças existem entre a liga belga e a nossa?
Em Portugal há uma maior preocupação táctica. A maior parte das equipas procura jogar na transição, com um bloco médio. Aqui tentam jogar bem, mas não há equipas como Porto, Benfica ou Sporting. Aqui o último pode ganhar ao primeiro. Há muita gente nos estádios, relvados óptimos... É um bom campeonato, sem dúvida.
É o seu quinto clube lá fora. Dá-se bem com a distância?
Não, é complicadíssimo. Quando sais do país se calhar a parte financeira é o que te leva a tomar essa decisão. Se não tivesse um contrato muito melhor do que tinha aí não tinha saído. Custa muito estares longe dos teus, ainda para mais com um filho com sete meses.
Há dois anos disse: “Se me chamasse Marrecovic, sei bem onde estava”. Sente que no futebol português sobrevalorizam-se os estrangeiros?
Essa frase foi para defender o jogador português e foi mal interpretada. É lógico que a condescendência é diferente, tal como as oportunidades. Existem diferenças, até nos vencimentos. É mais fácil pagar mais a um jogador que vem de fora do que aos portugueses.
Viveu algum episódio caricato no estrangeiro?
Lembro-me de um na Bulgária. O treinador encostava-se à vedação para o presidente lhe dizer as substituições. Era surreal!
Está a tirar o curso de psicologia. Acha que um jogador com formação académica pode ser melhor em campo?
Não. Acho que pode ser melhor numa parte essencial, que é depois fora do campo. E, seja aos 20 ou aos 25, temos de pensar nisso. Um jogador pode ganhar muito dinheiro, mas se não o souber gerir e aplicar vai ter um futuro complicado. Os estudos dão essa estrutura.
Contribuiu para o título do Tondela na época passada com 23 golos. Foram uns justos campeões?
Fomos. Foi uma época extremamente desgastante. Fiz mais de 50 jogos, uma brutalidade. E jogámos um futebol alegre, com dois pontas-de-lanças e dois extremos, o que é raro de ver na II Liga. Além disso, os campeões são sempre justos.
Em Junho foi a Fátima a pé. Voltou a fazer promessas?
Não. Foi a única vez que misturei religião e futebol. Depois de tantos jogos, bem que me custou fazer aqueles 83 kms seguidos. Foram umas 20 horas. Foi penoso, mas está feito. Foi por uma boa causa.
Ainda se vê na Selecção Nacional?
Toda a gente pode sonhar, mas tenho os pés bem assentes na terra. Sei que já não vou jogar num dos três grandes, tenho plena consciência disso, por isso é que procurei agora alguma estabilidade. Mas todos podemos sonhar.
Inscreveu-se no sindicato dos países onde jogou?
Não. Aqui na Bélgica os jogadores têm um seguro muito bom, é uma regra da Liga. De três em três meses, os clubes depositam um valor numa conta e só podes levantar esse dinheiro aos 35 anos. É uma excelente medida para defender os jogadores.
Qual é a sua opinião sobre a actuação do SJPF?
Acho que é importante, especialmente nos casos em que há salários em atraso. O presidente tem feito um esforço para lutar contra os clubes devedores e defender o jogador português, e tem conseguido.
Perfil
Nome: António José (Tozé) Marreco Gouveia
Data de nascimento: 25 de Julho de 1987
Posição: Avançado
Clubes que representou: União de Coimbra, Mirandense e Académica (formação), Pampilhosa, Zwolle (Holanda), Alavés (Espanha), Lokomotiv Mezdra (Bulgária), Servette (Suíça), Desp. Aves, União da Madeira, Naval, Beira-Mar, Tondela, Olhanense, Tondela e Mouscron (Bélgica).
Foto: Vitor Garcez/ASF