O Futebol Clube do Porto: o que é preciso dizer...
Há mais de 40 anos que me iniciei, colaborando na Imprensa, como crítico desportivo, procurando conciliar o respeito pelos meus adversários com a defesa das conclusões a que me levam o estudo e a investigação. Guardo, por isso, ciosamente, a minha identidade e a minha independência – o que me leva a escrever que, através do meu convívio com José Maria Pedroto e com Jorge Nuno Pinto da Costa, estou entre os que assistiram ao nascimento “deste” Futebol Clube do Porto. E escrevi “deste”, porque há que assentar, antes do mais, num ponto nodal: Jorge Nuno Pinto da Costa e José Maria Pedroto refundaram o Futebol Clube do Porto. Serão muitos, neste passo, os que arremetem e com razão: “Mas quantas vezes falou você, com José Maria Pedroto?”. Respondo, em verdade: Talvez, em números redondos, uma dúzia de vezes. Mas foi o suficiente para concluir que germinava, na mente do “Zé do boné”, a mais poderosa obra de reconstrução de um clube, jamais levada a cabo, no nosso país.
Quando o treinador do Porto manifestou interesse em falar comigo, surpreendeu-me, de facto. O professor João Mota, seu adjunto, seu “amigo de todas as horas” e também meu querido amigo, esclareceu-me: “O Sr. Pedroto é assim: se encontra uma pessoa que traz consigo ideias novas, respeitantes ao futebol, imediatamente aproxima-se dela. É de uma curiosidade rara”.
E acrescentou a sorrir: “E vai convidá-lo a ir ter com ele à pastelaria Petúlia. É fatal!”. Tudo se passou como o João Mota previu e, numa das minhas idas ao Porto, lá fui à Petúlia, para a minha primeira conversa inesquecível com José Maria Pedroto. A impressão imediata que dele tive foi a de uma pessoa que não cativava, nem aduladores, nem clientelas. Não procurava ser hipocritamente bem-educado. Era-o, mas por uma delicadeza que lhe saía da alma. Demais, era frontal, direto e de grande sagacidade e honestidade. Por isso, as perguntas choveram, como em dia de temporal: “Ó Manuel Sérgio, diga-me cá: por que diz você que não existe Educação Física? E por que acha que a preparação física, no treino desportivo, tem de ser repensada? E o que tem a ver o futebol com as ciências humanas? Qual é então a metodologia que propõe para o treino desportivo?
Sem procurar transviar-me das questões levantadas, respondi ao que me era solicitado, com alguma galhardia e a lucidez possível (que não é muita). Ele fitou-me com aprazimento, mas não deixou de acrescentar: “Tudo o que me está a dizer é bonito de ouvir, mas nada resulta, sem uma sólida organização”. E após uma breve pausa: “ E vai ser o Jorge Nuno a criar a organização que eu prevejo para o Futebol Clube do Porto”. Há 33 anos, pela generosidade de José Maria Pedroto, ouvi eu o segredo das vitórias deste Clube (que é hoje, no que ao futebol diz respeito, um dos melhores do mundo): a organização – que supõe liderança, disciplina e o saber que a Sociedade do Conhecimento inapelavelmente exige. O que distingue o “Porto” dos outros Clubes de futebol, em Portugal, não são os favores dos árbitros (os nossos árbitros não temem cotejo com o que de melhor se encontra, na arbitragem, por esse mundo além) nem escondidos conluios com qualquer entidade tenebrosa – o que o distingue é a organização, à luz de um conhecimento atualizado. Este é o segredo das vitórias do FC Porto, no meu modesto entender. É evidente que me esqueci de realçar, na indispensável liderança, a pertinácia, a resistência, a astúcia de Jorge Nuno Pinto da Costa. A sua vivacidade loquaz é o mais aparente de uma sabedoria que se adivinha...